JUIZ FEDERAL DIZ QUE A GREVE SÓ É PROIBIDA PARA AS FORÇAS ARMADAS.
DIREITO DE GREVE , HIERARQUIA E DISCIPLINA nas Policias MILITARES DO
BRASIL.
O fim da greve de policiais civis em São Paulo trouxe à tona a discussão
sobre o direito de greve de servidores públicos em geral e, em particular, de
policiais. O debate é oportuno. Alguns alegam que a greve de policiais
militares dos estados conspira contra disposição constitucional que versa
sobre a hierarquia e a disciplina.
No entanto, quando se irrompe o movimento grevista, não há que falar em
quebra da hierarquia, que se refere à estrutura organizacional graduada da
corporação e que se mantém preservada mesmo nesse instante. A inobservância
de ordens provenientes dos que detêm patentes superiores, com a
paralisação, caracteriza ato de indisciplina? Recorde-se que a determinação
proveniente de superior hierárquico, para ser válida, deve ser legal. Jamais,
com base na hierarquia e na obediência, por exemplo, há que exigir de um
soldado que mate alguém apenas por ser esse o desejo caprichoso de seu
superior.
Logo, se existem condições que afrontem a dignidade da pessoa humana no
exercício da atividade policial, o ato de se colocar contra tal estado de coisas
jamais poderia ser tido como de indisciplina. A busca por melhores salários e
condições de trabalho não implica ato de insubordinação, mas de recomposição
da dignidade que deve haver no exercício de qualquer atividade remunerada.
Portanto, se situa dentro dos parâmetros constitucionais.
Quanto às polícias civis e federais, não há sequer norma semelhante à
anterior, até mesmo porque possuem organização diversa. No entanto,
para afastar alegações de inconstitucionalidade da greve de policiais, o
mais importante é que não se deve confundir polícia com
Forças Armadas.
Conforme previsão constitucional, a primeira tem como dever a preservação da
ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. Já as segundas,
constituídas por Exército, Marinha e Aeronáutica, destinam-se à defesa da
pátria e à garantia dos Poderes, da lei e da ordem.
Às Forças Armadas, e somente a elas, é vedada expressamente a greve (artigo
142, parágrafo 3º, inciso IV, da Constituição). Ressalte-se que em nenhum
instante foi feita igual referência à polícia, como se percebe dos artigos 42
e 144 do texto constitucional. A razão é simples: somente às Forças Armadas
não seria dado realizar a greve, um direito fundamental social, uma vez que
se encontram na defesa da soberania nacional. É de entender a limitação em um
texto que lida diretamente com a soberania, como a
Constituição Federal.
O uso de armas, por si só, não transforma em semelhantes hipóteses que são
distintas quanto aos seus fins. As situações não são análogas. A particularidade
de ser um serviço público em que os servidores estão armados sugere que a
utilização de armas no movimento implica o abuso do direito de greve, com
a imposição de sanções hoje já existentes.
Não existe diferença quanto à essencialidade em serviços públicos como saúde,
educação ou segurança pública. Não se justifica o tratamento distinto a seus
prestadores. Apenas há que submeter o direito de greve do policial ao saudável
ato de ponderação, buscando seus limites ante outros valores
constitucionais.
Não é de admitir interpretação constitucional que crie proibição a direito
fundamental não concebida por legislador constituinte. Há apenas que
possibilitar o uso, para os policiais, das regras aplicáveis aos servidores
públicos civis.
No mais, deve-se buscar a imediata ratificação da convenção 151 da OIT
(Organização Internacional do Trabalho), que versa sobre as relações de trabalho
no setor público e que abre possibilidade à negociação coletiva, permitindo sua
extensão à polícia.
Uma polícia bem equipada, com policiais devidamente remunerados e trabalhando
em condições dignas não deve ser vista como exigência egoísta de grevistas.
Trata-se da busca da eficiência na atuação administrativa (artigo 37 da
Constituição) e da satisfação do interesse público no serviço prestado com
qualidade.
* Marcus Orione Gonçalves Correia doutor e livre-docente pela USP, professor
associado do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social e da
área de concentração em direitos humanos da pós-graduação da Faculdade de
Direito da USP, é juiz federal em São Paulo
(SP)
(SP)
Revista Consultor Jurídico
Colaborador: Paterson Manoel da Silva
Colaborador: Paterson Manoel da Silva
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