Encontra-se em tramitação desde 2004, na Câmara de Deputados, a Proposta
de Emenda à Constituição Nº 308 (PEC 308). Esta Proposta pretende criar a
Polícia Penal Federal e as Polícias Penais das unidades federativas (Distrito
Federal e 26 estados), o que corresponderá à entidades administrativas
autônomas – Departamentos de Polícia Penal. Daí a necessidade de “emancipação”
do Sistema Penitenciário Federal e de alguns órgãos prisionais locais, que não
o são.
A PEC 308 visa tão somente o reconhecimento constitucional das
atividades de segurança prisional e reinserção social, já desenvolvida, ainda
que de forma precária e desuniforme, pelos órgãos de administração
penitenciária local e até pelo Sistema Penitenciário Federal, hoje, amparados
no parágrafo único do Art. 72 e Art. 73 da LEP, respectivamente. A PEC 308
conduzirá a um status constitucional de Instituição Policial o Sistema Penitenciário
Federal e as demais entidades que administram os sistemas penitenciários dos estados-membros
e do Distrito Federal. Apesar de a Proposta denominar, em sua origem, estas instituições
de “Polícia Penitenciária”, após a sua passagem pela Comissão de Constituição e
Justiça e pela Comissão Especial, ambas da Câmara de Deputado, sofreu algumas
emendas supressivas e substitutivas que alteraram parcialmente o seu texto, e,
a sua denominação, para “Polícia Penal”. A alteração terminológica
justificou-se, pois, o termo “penitenciário” é restritivo, ou seja, refere-se a
um tipo de estabelecimento prisional em particular, enquanto o termo “Penal”
alcançaria todos os tipos de estabelecimentos prisionais e entidades de reintegração
social do apenado e do egresso, a exemplo da Casa do Albergado e do Patronato.
Possivelmente, após as citadas emendas, a PEC 308 será votada com o
seguinte texto:
“PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 308, DE 2004
Altera os
arts. 21, 32 e 144, da Constituição Federal, criando as polícia penal federal e
as polícias penais estaduais e do Distrito Federal.
As Mesas da
Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3º do art. 60 da
Constituição Federal, promulgam a seguinte emenda ao texto constitucional:
Art. 1º. O
inciso XIV, do art. 21, passa a vigorar com a seguinte redação:
"XIV -
organizar e manter a polícia civil, a polícia militar, a polícia penal e
o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal, bem como prestar assistência
financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos por meio de
fundo próprio."
Art. 2º. O
parágrafo quarto do artigo 32 passa a vigorar com a seguinte redação:
"§ 4º.
Lei federal disporá sobre a utilização, pelo Governo do Distrito Federal, das polícias
civil, militar e penal e do corpo de bombeiros militar."
Art. 3º.
Acrescentem-se ao art. 144, os seguintes incisos VI, VII e parágrafos 10 e 11:
"VI –
polícia penal federal;"
“VII – polícias
penais estaduais e do Distrito Federal .”
"§ 10.
Às polícias penais incumbem, no âmbito das respectivas jurisdições e subordinadas
ao órgão administrador do Sistema Penitenciário da unidade federativa a que pertencer:
I –
supervisionar e coordenar as atividades ligadas, direta ou indiretamente, à segurança
interna e externa dos estabelecimentos penais;
II –
diligenciar e executar, junto com os demais órgãos da Segurança Pública estadual
e/ou federal, atividades policiais que visem à efetiva recaptura de presos
foragidos das unidades penais;
III –
promover a defesa das instalações físicas das unidades prisionais, inclusive no
que se refere à guarda das suas muralhas;” (grifo)
Percebe-se, assim, que a Polícia Penal poderá cessar a desordem nos
Sistemas Prisionais e de Reintegração Social, hoje, evidentes em todo o país,
sem invadir a competência de qualquer outro órgão policial e, como verá mais a
frente, com diminutos impactos orçamentários, levando-se em conta o montante
que deixará de ser desperdiçado. Contudo, haverá sempre os “tecnocratas”6, como
se refere o Dr. Ricardo Balestreri àqueles que “só enxergam planilhas e não pessoas,
gastos e não investimentos, estatísticas e não vidas.”
O Coronel de Polícia Militar e ex-comandante da Guarda Prisional de
Minas Gerais, Amauri Meirelles7 argumenta com propriedade sobre a problemática
da segurança prisional em relação à implantação da Polícia Penal no Brasil:
“(...) Difícil será debater com quem fundamenta seus
pontos de vista em princípios doutrinários arcaicos, anacrônicos”. Contudo, se
houver uma postura receptiva para o diálogo, para o debate construtivo,
provavelmente ocorrerá reexame de posicionamentos.
Há poucas discordâncias no varejo e fortes concordâncias no atacado. As
divergências têm fulcro na ambigüidade conceptual e na heterogeneidade
doutrinária, cuja origem, entretanto, está numa área bem mais ampla que a
discussão sobre a Polícia Penal. A gênese está numa instância superior, onde
continuam sendo discutidos, em relação à sociedade, conceitos e doutrina de
proteção, de insegurança, de segurança pública, dedefesa social, de sistema
policial, de ameaças, de vulnerabilidades e outros mais. A discussão sobre a
Polícia Penal vem ensejando, residualmente, a oportunidade de se conhecer e
entender melhor a instituição-polícia, o sistema policial, o ciclo completo de polícia
e o sistema de defesa da sociedade.
Quem é contrário argumenta, basicamente, que o sistema penitenciário não
se confunde com o sistema policial; que as atribuições previstas pela PEC, para
a Polícia Penal, são atribuições de polícias já existentes, inviabilizando-a;
que essa atividade não é atividade policial; que o Congresso, como solução para
a segurança pública, estaria propondo a criação de uma nova polícia, além de
outras colocações descabidas.
Entendemos que o Sistema Penitenciário (sistema penal, sistema prisional),
como está disposto, integrado pelo Ministério Público, Defensoria Pública,
Judiciário e Administração Pública, óbvia e realmente não integra o sistema
policial. Entretanto, a Administração Pública Penal o integra, sim.Reiteramos
nosso entendimento de que a atividade desenvolvida pela Administração, na
execução penal, é uma atividade típica de polícia, basicamente através do
exercício do poder de polícia administrativa penal e eventualmente através do
exercício da força de polícia penal. Volta-se ao entendimento inovador de que o
Estado existe, basilarmente, para prover a proteção e promover o
desenvolvimento. E, para isso, detém autoridade, bipartida em poder e força.
Muitas pessoas, ainda, enxergam Polícia como sendo o órgão que “corre atrás de
ladrão e prende bandido” ou que “previne e reprime crimes”. Isso é muito pouco!
Polícia é instituição / sistema / atividade estatal de proteção social,
distribuída em estruturas de poder e força, garantidora da ordem social.
(...)” (grifo)
Segundo Luis Mauro Albuquerque de Araújo8, Diretor Penitenciário de Operações
Especiais e Policial Civil do Distrito Federal:
“É engano de quem pensa que a função do agente penitenciário é reeducar
e ressocializar. Ele é o responsável
pela custódia do preso, pela segurança do estabelecimento e com isso deve preparar
o ambiente para que os órgãos responsáveis possam ressocializar, ensinar e
promover cursos técnicos. É necessária a criação da polícia penitenciária,
pois não justifica todas as forças de segurança trabalharem para prender, a justiça
condenar e os internos ficarem sob a guarda de pessoas comuns, sem que tenham condições
para contê-los. Essas pessoas não têm como se defenderem do crime organizado, não
possuem porte de arma e treinamento adequado. É imprudente e ato de covardia colocar
ovelhas para tomarem conta de lobos.” (grifo)
O emprego de policiais militares e civis desviados para os sistemas
prisionais nos estados também será solucionado com a PEC 308. Este contingente,
que é expressivo, retornará as suas funções de policiamento ostensivo e de
polícia judiciária, respectivamente. Como cita a CPI do Sistema Carcerário9:
“Outro problema verificado pela CPI é a utilização de policiais
militares para o exercício das funções de servidores penitenciários. O Sr. Luiz
Antônio Nascimento Fonseca cita o exemplo do Acre, onde 800 policiais militares
atuam dentro dos presídios. Para ele, esses policiais deveriam estar, de forma
ostensiva, nas ruas a prover segurança à sociedade.”
Ao fim da CPI do Sistema Carcerário, em julho de 2008, após 11 meses de
trabalhos, concluiu-se10:
- melhoria das condições de trabalho dos profissionais;
- aprovação da PEC 308, que cria a Polícia Penitenciária;
- criação da Força Nacional de Intervenção Penitenciária;
- construção da Escola Penitenciária Nacional;
- programas de saúde e de habitação aos agentes penitenciários;
- criação e fortalecimento dos planos de carreira;
- participação dos representantes dos agentes penitenciários no Conselho
Nacional de
Política Penitenciária.” (grifo)
A diminuição na reincidência estabilizará o quantitativo da população
carcerária, que hoje, aumenta sem controle. Com o passar do tempo, haverá a
paulatina queda deste efetivo e redução de novas demandas, exigindo-se menores
investimentos na Policia Judiciária, no Poder Judiciário e tantos outros
setores de defesa social. A CPI acrescentou11:
Em alguns países a valorização do profissional e do
sistema penal é essencial como uma força policial ate porque a pessoa presa
passa o maior tempo no sistema penitenciário, a exemplo o que já ocorre nos
EUA, Itália, Alemanha, dentre outros países desenvolvidos.
A Polícia Penal da Itália. http://www.polizia-penitenziaria.it/
“Polizia Penitenziaria”, desenvolvida a partir de seu próprio sistema prisional criado em 1945, epresenta um marco na retomada do controle da violência comum e do crime organizado no país.
Os Agentes da Polícia Penitenciária mantém a ordem
e a segurança dentro dosestabelecimentos
penitenciários; realizam vigilância em hospitais, em tividades escolares e em locais de trabalho
dos presos. Tendo a essencial função de prevenir crimes, transgressões disciplinares
e fugas, além de garantir – in loco – o cumprimento das penas alternativas, quando imposta
pelo judiciário, como meio de inserção, ou alternativa a diminuição da
população carcerária.
Também, ao
se inserir à Polícia Penitenciária as atribuições de as ações preventivas de não
retorno ao crime, de acompanhamento de internos em liberdade condicional e de
egressos; a rígida fiscalização de penas e medidas alternativas, bem como, as
condições de suspensões do processo e da pena, fez-se reduzir os índices de
reincidências entre 50 a 60% na Itália.
Enquanto serviço de segurança armada ao longo das “muralhas” e vias de acesso aos estabelecimentos penais, tem o dever-ser de proteger a estrutura prisional contra atividades criminosas que visem facilitar o acesso de grupos armados, com objetivo de resgate ou de facilitação da evasão de presos.
Alexander dos Santos
Agente Penitenciário Federal lotado na Penitenciária Federal em Campo Grande - MS
Acadêmico do Curso de Gestão da Segurança Pública – Universidade do Sul de Santa Catarina
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